“Ocorre que nos relacionamos com o mundo externo a partir de um filtro, interpretamos o mundo de acordo com nossa experiência de vida, de forma bastante peculiar e individual”
Monique Catarinozzi: O ser humano é um ser de relações. Ele já inicia sua vida se relacionando com outras pessoas. Seu primeiro relacionamento se dá em torno do ato da nutrição. A criança estabelece contato com a mãe e neste momento este pequeno ser já cria expectativas de que esta pessoa é capaz de alimentá-lo, protegê-lo e amá-lo. A mãe cria expectativas em relação ao bebê de que esta será a pessoa que a acompanhará durante toda a sua vida, que será um bom filho, que lhe trará muitas alegrias, etc. O aleitamento é um período muito especial para ambos; além disso, é neste momento de acolhimento que a criança desenvolve o sentimento de segurança interior irá servir de base para a construção de sua personalidade. O amor-próprio é construído a partir da forma que esta criança foi acolhida e se relacionou com sua família, e posteriormente escolas e amigos. Não nascemos para vivermos sozinhos e sim em comunidade.
Ocorre que nos relacionamos com o mundo externo a partir de um filtro, interpretamos o mundo de acordo com nossa experiência de vida, de forma bastante peculiar e individual. Assim, acerca de tudo o que acontece no presente e do que esperamos que aconteça no futuro, criamos expectativas sobre o que está em relação conosco. Não poderia ser diferente em relação às pessoas com quem estabelecemos contato.
Expectativas são idéias criadas por nós sobre o que esperamos daquilo que está em relação conosco. Em geral discute-se bastante sobre as expectativas que criamos quando estamos apaixonados. Enxergamos no outro apenas suas qualidades e deixamos de ver seus defeitos. Apaixonamo-nos pela fantasia que criamos de quem seja aquela pessoa e, por vezes, apenas depois de muito tempo percebemos que aquela não era a pessoa que conhecíamos. Na verdade aquela pessoa sempre esteve ali, mas nosso filtro pessoal não permitiu que enxergássemos com clareza determinadas características.
Entretanto, estas expectativas estão presentes em todas as relações que estabelecemos, não somente nas amorosas. Criamos expectativas quanto ao emprego novo, quanto ao chefe novo, quanto aos amigos que estamos conhecendo agora, quanto aos governantes que elegemos. É claro que quanto mais próximos e quanto mais estas pessoas geradoras de expectativas estão, mais importantes serão para nós a confirmação ou não dessas expectativas.
O que não podemos é deixar que as expectativas deixem de ser especulações e se tornem diretrizes absolutas, idéias pré-concebidas que norteiem nossas atitudes e nos fechem para a experiência que só a realidade, no presente, no aqui e agora, é capaz de trazer. Outro problema que ocorre é quando criamos expectativas além da realidade e buscamos que ela se concretize; não aceitamos perceber que determinadas idéias que criamos não podem ser alcançadas sejam por limitações nossas ou de outros. Isto é muito perigoso, no sentido de perdermos um tempo valioso de nossas vidas em busca de algo que não poderemos alcançar. E mais: a sensação de fracasso causada por não se conseguir alcançar tão elevadas expectativas acaba levando a uma baixa auto-estima que é muito prejudicial em todos os âmbitos de nossas vidas.
As pessoas com baixa auto-estima normalmente solicitam ajuda psicológica por se sentirem inadequados, ansiosos e possuem pouco amor-próprio. Tendem a criar relações em que o outro supra todas as suas necessidades, e ao mesmo tempo, desconfiam de expressões de amor e de apoio do companheiro, como se estivessem sempre à espera da rejeição. E por medo de romperem com relacionamentos destrutivos e ficarem sozinhos, mantêm a qualquer preço essas relações.
Em suma, é impossível não criarmos expectativas. Elas são naturais e até mesmo necessárias para nosso convívio em sociedade. Entretanto, é preciso cuidado para que nossas expectativas não se tornem a nossa única fonte de informação do mundo externo, para que através do diálogo as expectativas possam ser o mais próximo possível da realidade, assim evitando frustrações que muitas vezes poderíamos evitar com uma simples e sincera conversa.
MONIQUE CATARINOZZI É PSICÓLOGA E COLUNISTA CONVIDADA.
(CRP/05Nº30364)